.
Transcorria o ano de 1556.
Dom Pero Fernandes Sardinha — nosso primeiro bispo;
Tomava a nau Nossa Senhora da Ajuda, acompanhado de eclesiásticos, pessoas da sociedade e famílias inteiras rumo a Portugal.
Um acidente fatal a fez soçobrar pouco depois de zarpar de Salvador.
Os que escaparam ao naufrágio — e foram muitos;
Acabaram capturados e devorados pelos ferozes índios caetés, na margem esquerda do rio São Miguel, ainda hoje indicada graças à crença popular.
Eis um acontecimento característico do estado dos índios brasileiros por ocasião da chegada dos nossos primeiros colonizadores e missionários.
Para darmos uma ideia da mudança ocasionada pelo influxo do Cristianismo e da civilização;
Apresentaremos, um quadro geral da situação em que se encontravam os aborígines na época do
descobrimento do Brasil.
Nomadismo e promiscuidade
Talvez a maior descoberta dos portugueses ao desembarcarem em nossas terras tenha sido os próprios índios;
Um tipo humano ainda não conhecido pelos lusos em nenhuma parte do mundo.
A única ciência dos indígenas era a floresta.
O objetivo de suas vidas era comer, beber, caçar, combater e matar…
As aldeias que construíram — as tabas duravam no máximo quatro anos:
As madeiras apodreciam, as palmas dos tetos de suas ocas já não os cobriam e toda a caça da redondeza estava exterminada.
Se alguma tribo se dedicava precariamente à agricultura, as terras cultiváveis estavam cansadas, o que obrigava os silvícolas a se mudarem de local.
Além de predadores da natureza, nossos índios, com seus costumes nômades, jamais conheceram qualquer tipo de desenvolvimento.
Os laços sociais que os uniam eram de tal maneira frouxos que essas pequenas tribos se fracionavam cada dia mais.
As constantes guerras de extermínio entre elas constituíam motivo para que se debilitassem e diminuíssem em número.
Nessas pobres almas predominava o instinto de vingança.
Iniciadas as rixas que eram transmitidas de pais para filhos;
Não se poderia esperar nenhum sentimento de abnegação em favor do interesse comum e tampouco da posteridade.
Ao contrário de certas visões idílicas que alguns autores indigenistas procuram dar à vida tribal, ela se caracteriza pela mais completa promiscuidade;
Causadora de todas as espécies de doenças e vícios morais.
Vários cronistas da época relatam que os índios, antes da conversão, moravam em casas compridas — as ocas;
Cuja superfície era de trezentos ou quatrocentos palmos por cinqüenta de largura;
Suas paredes eram de palha e o teto recoberto de folhas de palmeiras.
Dentro delas viviam esparramados indistintamente cerca de cem a duzentos silvícolas.
Entrando na oca, via-se a todos e tudo quanto nela se encontrava.
Uns cantavam, outros riam, outros choravam, alguns preparavam farinha, outros o cauim etc.
Havia pequenos fogos por todos os lados dando uma aparência de labirinto ou de um pequeno inferno.
Essas tabas eram escura, malcheirosas e esfumaçadas.
À guisa de camas, os infelizes nativos usavam uma espécie de rede que exalava um odor horripilante;
Pois eles eram tão preguiçosos que nem se levantavam para satisfazer suas necessidades naturais.
Índios canibais
Eram seres humanos inteiramente rudimentares, ferozes, astutos, mentirosos e traiçoeiros.
E, além do mais, eram canibais.
As cerimônias de matanças públicas serviam de pretexto para festas e ajuntamentos.
Daí a denominação de “antropofagia ritual” que lhes deram.
Os aborígines comiam seus inimigos por vingança.
Suas expedições guerreiras tinham também como fim proverem-se de carne humana.
Durante os combates, os índios visavam sobretudo à captura de prisioneiros.
Após uma luta preliminar, os guerreiros de ambos os lados precipitavam-se uns contra os outros, esforçando-se para desarmar o adversário e aprisioná-lo vivo.
Os mortos e feridos no campo de batalha eram dizimados e devorados imediatamente, levando-se também diversas partes assadas para casa.
A expedição vitoriosa fazia uma entrada triunfal em todas as tabas aliadas, ao longo do caminho.
Ao chegar à aldeia de origem, as tropas obrigavam o prisioneiro a gritar: eu, vossa comida, cheguei!
Nenhum deles podia escapar ao sacrifício ritual para o qual era destinado.
Caso adoecesse, os indígenas levavam-no mata adentro e partiam-lhe o crânio, deixando o cadáver insepulto.
A duração do cativeiro variava muito, pois os velhos eram mortos sempre no retomo da expedição;
Enquanto os jovens poderiam manter-se cativos por vários meses, até anos.
Marcada a data da execução, todos os vizinhos e aliados eram convidados a tomar parte no festim.
Passavam a noite precedente, num simulacro de vigília, a dançar, cantar e beber.
Logo ao alvorecer, várias mulheres conduziam a vítima amarrada pela cintura até a praça da execução, no centro da aldeia, em meio a grande alvoroço.
Aparecia então, no pátio, o carrasco dançando com um enorme tacape nas mãos, e;
Aproximando-se do prisioneiro, o brandia com toda força, quebrando-lhe a cabeça.
Mal o mísero massacrado caísse morto, velhas índias precipitavam-se sobre ele para recolher em uma cuia o sangue e os miolos que eram engolidos ainda quentes.
Em seguida, o cadáver era assado como se fosse um porco e depois esquartejado, levando-se então os pedaços às cabanas em meio a gritos de alegria.
Os selvagens acreditavam que, comendo a carne do inimigo, apropriavam-se de suas qualidades e manifestavam sua superioridade sobre ele.
.
Continua…
.
Fonte: ipco.org.br
.
.
* * *
.
.
.
.
,
.