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Quantas coisas não se podem dizer da língua, das suas elevações e abismos, das suas contradições!
Basta folhear a Sagrada Escritura para ensinamentos a esse respeito.
Por exemplo, São Tiago escreve:
“Com ela (com a língua) bendizemos o Senhor nosso Pai, e com ela amaldiçoamos os homens, feitos à semelhança de Deus. De uma mesma boca procedem a bênção e a maldição.
Não convém que seja assim! Porventura lança uma fonte por uma mesma bica água doce e água amarga? Acaso pode a figueira dar azeitonas ou a videira dar figos?” (Tg 3, 9-12).
São palavras bem incisivas do Apóstolo, que apontam – falando sempre com imagens simbólicas, como Nosso Senhor Jesus Cristo – diretamente para a “fonte”, para a raiz de onde brotam os bons e os maus influxos da língua.
Trazem à memória os ensinamentos de Nosso Senhor:
“Uma árvore boa não dá frutos maus, uma árvore má não dá bom fruto, porquanto cada árvore se conhece pelo seu fruto. Não se colhem figos dos espinheiros, nem se apanham uvas dos abrolhos.
O homem bom tira coisas boas do bom tesouro do seu coração, e o homem mau tira coisas más do seu mau tesouro, porque a boca fala daquilo de que o coração está cheio” (Lc 6, 43-45).
Se quisermos uma chave para tudo quanto se possa dizer acerca da língua, estas últimas palavras de Jesus no-la dão.
Elas servem como que um pano de fundo para todas as reflexões que virão a seguir e que visam considerar a língua com olhos cristãos.
E, a propósito disto, vem-me à memória uma lembrança da infância, que é comum com certeza a muitos outros um pouco menos jovens.
Quando – coisa não rara num garoto – irrompia uma indisposição intestinal que ia um pouco além do trivial cotidiano, aparecia em casa o doutor, essa figura impagável e inesquecível do médico de família.
O médico, invariavelmente, após informar-se dos sintomas e das possíveis causas (“que andou comendo este menino?”), ordenava: – “Mostre a língua! Tire a língua!”.
E as crianças sabíamos que, das tonalidades da pequena língua esbranquiçada e às vezes sulcada de estranhos rogos, o doutor amigo tiraria conclusões certíssimas;
Que se traduziriam numa receita indecifrável para todos exceto para o honesto farmacêutico que a manipularia.
Penso que o Nosso Senhor poderia dizer-nos também, como Médico divino:
“Mostra-me a língua, e eu te farei ver o teu coração, porque as tuas palavras – com as suas mil tonalidades, cargas, intenções e acentos – são um retrato falado do teu coração:
Dos teus sentimentos mais íntimos, das tuas purezas e sujidades, dos teus tesouros espirituais e das tuas carências lastimáveis.
Não me esqueças nunca que a boca fala daquilo de que o coração está cheio”.
Mostrar a língua, ver a língua e as suas fontes, procurar o modo de limpá-la, de elevá-la aos níveis do amor cristão e de torná-la instrumento da caridade e da verdade de Cristo, eis o objetivo que se propõem estas páginas.
Nelas começaremos com algumas considerações sobre a língua – a palavra – e o amor;
Para passarmos depois a uma reflexão sobre as relações indissolúveis que deve haver entre a palavra e a verdade.
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Fonte: Retirado do livro “A Língua” do Rev. Pe. Francisco Faus.
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